Humanos ou algoritmos: quanto vale a Saúde no capitalismo “dataficado”?

Se a pandemia da Covid-19 deu um senhor empurrão no processo, que já era acelerado, de digitalização das sociedades, por outro lado fortaleceu uma arena cobiçada pelos neoliberais da economia de mercado: é a “dataficação” do capitalismo, como cunhou a Jornalista e Cientista Social Joyce Souza, pesquisadora da Universidade Federal do ABC paulista.

Enquanto nos regalamos em uma orgia de aplicativos que monitoram nosso peso, bem estar, saúde mental, sintomas de gripe, entrega domiciliar de remédios, consultas virtuais ou diagnósticos e suplementos comprados pelo Facebook (aquele rede social criada para servir de ponto de encontro dos amigos de faculdade de Mark Zuckerberg e Eduardo Saverin) – os empresários da indústria farmacêutica fazem sua festa privê.

Nossos dados pessoais de Saúde (apesar de protegidos pela Lei Geral de Proteção de Dados na condição especial de “sensíveis”) navegam soltos e leves no cyberespaço. Em parte, por causa da nossa ignorância e boa fé; parte porque as regulações específicas que deveriam impor limites de atuação dos entes privados, vigilância e penalidades simplesmesnte não existem.

E os dados pessoais dos cidadãos têm valor comercial – uma lição que boa parte da sociedade ainda não aprendeu, mas as gulosas corporações já conhecem há bastante tempo.

Os achados de Joyce Souza em uma pesquisa de campo feita nas farmácias de São Caetano, interior de São Paulo, e divulgada em recente evento virtual do Idec sobre Saúde e Proteção de Dados, são de cair o queixo.

A pesquisadora constatou que, em troca de descontos gordos em remédios, as drogarias vinham coletando dados pessoais, clínicos e até financeiros dos clientes (como o valor gasto e a forma de pagamento) e repassando-os para as seguradoras e planos privados de Saúde.

Mercantilizadas, nossas informações privadas entram naquele caldeirão high-tech chamado deep learning – computadores com grande capacidade e velocidade de processamento de big data (volumes gigantescos de dados – meus, seus, de todos) onde algoritmos autodidatas que aprendem com a experiência identificam padrões e parâmetros de comportamento das populações.

Com qual objetivo? Essa é a pergunta que vale (literalmente) um milhão de dólares.

O fato é que, enquanto a sociedade, o Legislativo, o Judiciário e o Estado não forçarem e estabelecerem um marco legal para a proteção de dados pessoais de Saúde – de modo a que sua coleta e tratamento sirva para aperfeiçoar serviços, tratamentos, diagnósticos; reduzir as desigualdades de acesso, respeitar a privacidade e os princípios dos direitos humanos -, o que teremos é uma Inteligência Artificial pisando em pescoços para tão-somente seguir enriquecendo os milionários do mundo.

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Comentários (2)
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  • Acacia

    ? ? ? ? ?

  • Romilda Pigeard

    Venho acompanhado a sua produção de artigos sempre com conteúdos coerentes e assuntos atuais e interessantes, é sem dúvida um assunto instigante e reflexivo . Parabéns !!!