Numa favela de Nairobi, o futebol é a esperança de centenas de crianças

Projeto social Acakoro, parceria entre austríacos e quenianos, fomenta Esporte e Educação como caminho para aliviar pobreza e oferecer alternativa à juventude local

A comunidade esportiva mundial tem importante contribuição a dar no sentido de influenciar as sociedades a abraçarem a Agenda 2030 para um desenvolvimento sustentável, frisou a ONU neste mês de abril quando celebrou o Dia Internacional do Esporte para o Desenvolvimento e a Paz.

E isso não apenas porque a adoção do transporte sustentável está intimamente conectada com modalidades desportivas – como a bicicleta, o skate, a caminhada. Mas também porque atletas são ídolos, são modelos admirados e seguidos por multidões, e portanto capazes de mudar atitudes quando se engajam em advocacy por boas causas – e deter os impactos nefastos das mudanças climáticas é uma bastante premente.

A prática de esportes promove a saúde e o bem-estar, a tolerância, o entendimento e a paz; tem reflexos positivos na educação e na formação cívica dos cidadãos. Quebra barreiras linguísticas e culturais, incentivando a uma convivência pacífica.

O desenvolvimento pelo esporte também possui lugar especial no preâmbulo da Agenda Internacional 2030, onde dispõe que “o esporte é importante facilitador do desenvolvimento sustentável. Reconhecendo que o esporte contribui cada vez mais para o desenvolvimento e a paz, promovendo a tolerância e o respeito, e que também apoia o empoderamento de mulheres e jovens, indivíduos e comunidades, bem como objetivos de saúde, educação e inclusão social”.

O esporte também é considerado como direito fundamental consubstanciado na Carta da Unesco de 2015, em seu artigo 1º, que estabelece: “a prática da educação física, da atividade física e do esporte é um direito fundamental de todos”.

É neste contexto que a Acakoro Community Based Organization (CBO) se insere. A escola de Futebol, situada na favela de Korogocho, na cidade de Nairobi, Quênia, é uma Organização Não-Governamental, sem fins lucrativos, fundada em 2013 como um projeto social de cooperação austríaco-queniano.

Ela é o braço social da Acakoro Football Academy, também em Nairobi, que tem vínculos fortes com o Barcelona, da Espanha – os treinos pagos na academia sustentam, em boa parte, o projeto social em Korogocho.

Como advogada, Doutoranda em Direito Ambiental e atualmente voluntária do projeto Acakoro, eu acredito que a existência de ações sociais como essa são poderosas aliadas para alcançarmos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Além disso, são iniciativas que fortalecem o cumprimento dos Direitos Humanos e Sociais, uma vez que a educação física, a atividade física e o esporte são direitos fundamentais e universais, e como tais constituem componentes importantes de uma educação equitativa e de qualidade.

A missão da Acakoro é de educar e orientar a criança e o adolescente através do esporte. Doze treinadores, alguns deles com passagem como jogadores da seleção queniana de futebol, realizam diariamente treinamentos de futebol juvenil de alta qualidade e enfatizam uma abordagem individual, dentro e fora do campo, para um desenvolvimento holístico dos seus assistidos.

Na escola de futebol da ONG Acakoro, cerca de 400 meninos e meninas entre 6 e 18 anos já tiveram acesso não só a aulas de futebol, mas também a todo o material necessário – desde uma bola por criança a uniformes e chuteiras, passando pelos equipamentos para o treino tático e mais o material de apoio para as atividades de reforço e acompanhamento escolar ministradas antes do treino.

Isso porque, além de proporcionar a atividade desportiva do futebol, a Acakoro cuida da orientação escolar e acadêmica de TODOS os assistidos.

Além do pagamento das mensalidades escolares, o projeto fornece os uniformes do colégio e a alimentação; acompanha os boletins e os deveres de casa. O objetivo é que a criança tenha condições de, por meio do esporte e da educação, encontrar uma saída da situação de extrema vulnerabilidade na qual está mergulhada.

“A Acakoro nutre o talento na educação e no futebol com o objetivo de que as crianças possam ter uma vida autodeterminada e independente”, explica o austríaco Lukas Mott, treinador profissional de futebol que atua como head coach da Academia e Diretor de Esportes da ONG.

“As crianças se beneficiam do desenvolvimento do caráter ao longo dos anos no projeto. Os treinadores funcionam como mentores e modelos para a próxima geração. Nossas crianças se saem melhor na escola do que as crianças que não estão no programa. Com o futebol, eles aprendem habilidades de vida e valores como pontualidade, respeito, obediência a regras”, acrescenta Mott, que é formado em Ciência do Esporte e treinador de futebol graduado pela Academia de Futebol do Barça.

“O futebol também dá às crianças a chance de encontrar um emprego como jogador profissional de futebol no Quênia ou no exterior. No entanto, a Acakoro segue os dois caminhos, da Educação e do Futebol, para que nenhuma criança fique para trás”, frisa ele.

O contexto social em que a Acakoro atua

Korogocho é é a terceira maior favela do Quênia e tem população estimada em aproximadamente 250 mil habitantes. A comunidade faz fronteira com um dos principais depósitos de lixo de Nairobi, o Dandora.

Korogocho tem altas taxas de pobreza, insegurança, moradias precárias e serviços sociais insuficientes. A pobreza resulta do desemprego, dos baixos níveis de educação e da orfandade principalmente devido ao HIV/AIDS. As principais necessidades dos moradores de favelas em Korogocho estão relacionadas a desemprego e ausência de serviços públicos essenciais – água potável, saneamento, energia, assistência pública de saúde.

Com infraestrutura precária, poucos recursos, superlotação e proximidade com o lixão, a saúde dos moradores de Korogocho é precária. Várias organizações oferecem clínicas gratuitas na favela, enquanto outras organizam o trabalho de prevenção do HIV/AIDS. A área foi destacada pelas autoridades por causa do alto abuso de drogas ilegais e álcool.

Uma pesquisa feita pelo Security Research and Information Center (SRIC) em 2014 havia constatado que o aumento dos níveis de criminalidade na favela tinha entre suas principais explicações a alta taxa de abandono escolar dos jovens: porque a vida em casa é muito difícil, a solução encontrada por eles é o crime.

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